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CAMPO & CIDADE

CAMPO & CIDADE

  • - Onévio Zabot - Engenheiro agrônomo e servidor de carreira da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) - Membro da Academia Joinvilense de Letras

CELEIRO FARTO - Onévio Zabot

Dia desses em prosa amistosa com os escritores Herculano Vicenzi e David Gonçalves enveredamos pelas lides campesinas, origem comum. Roceiros da gema. Causos do mato. Bons tempos vivenciados.

David foi taxativo citando o hábito de seu pai sempre de olho no celeiro. Na região do café, a famosa tuia. Nas colônias italianas, o sortido porão. E cantinas e ranchos rincões afora. Podemos, grosso modo, associá-los à dispensa, acrescido da horta doméstica e das criações. É evidente que, além ao autoconsumo, algum excedente era barganhado na vizinhança. Circulava pouco dinheiro, mas fome não se passava. Obviamente, havia os imprevidentes. Esses invariavelmente se atolavam de dívidas nas vendinhas de roça.

Montesquieu no clássico o Espírito das Leis que tratou da divisão do poder: executivo, legislativo e judiciário - como essência da democracia - abordou também sobre a influência do clima nos hábitos alimentares, na gastronomia e culturas dos povos. A longuíssimo prazo o fator ambiental sobrepõe-se ao fator hereditário. Ao fator genético. A cor da pele, por exemplo, nada mais é do que uma adequação do corpo ao ambiente. Ao clima hostil. Forma resistir à insolação ou indispor-se à mesma.

Neste aspecto, os povos das regiões frias, onde predominam invernos rigorosos, em face dessas limitações cedo aprenderam a abastecer os silos com cereais e outros gêneros alimentícios. Prevenir, o único remédio. Os invernos inclementes: uma dádiva para conservá-los, certamente, contribuía e muito. De outro lado, os povos das regiões tropicais, por natureza, adotaram o extrativismo como prática usual. O silo estava no próprio campo, nas matas, nos rios, lagos e mares. Bastava apanhar os viveres.


Franklin Cascaes que resgatou a memória das colônias de pesca no litoral catarinense destaca que, neste particular, o pescador -anfíbio por excelência - cuidava de suprir a renda e parte da alimentação, enquanto a mulher cuidava da horta e das criações domésticas. Hábito similar aos povos indígenas.

Algumas aves tem esse hábito - caso da gralha azul - que amoita o pinhão. Ao não o encontrar, por acaso, virou reflorestadora. E as abelhas seguem a mesma pegada. Armazenam mel.

Um hábito comum emergiu na prosa: conservar carne de suíno na banha. Fartura certa. Boa demais, palavras de Herculano. E com polenta e almeirão, uma delícia.

Como esquecer o porão de meu nono Francisco: pipa de vinho colonial, queijo, salame e copa em penca. E no entorno o pomar e a horta. E aves e suínos e colmeias para produção de mel. E a renda? Ora, a renda vinha da produção de feno de alfafa e da venda de leite. Assim rolava a vida na próspera aldeia às margens do rio do Peixe.

Mas, em razão da urbanização - forte aumento da demanda por bens rurais - o modelo reestruturou-se. E, gradativamente, esse hábito salutar esvaiu-se, salvo exceções.

O Lodi - colega da Epagri de Rio do Sul - comentava que, em levantamento realizado na região, constatou que famílias que praticavam o auto-abastecimento deixavam desembolsar o equivalente a 3,2 salários por mês. Número significativo, certamente.

Países como a Holanda incentivam a prática por menores que sejam os espações remanescentes. Sacadas e coberturas de edificações são aproveitadas para tal. As sobras orgânicas são recicladas. Compostagem. Ciclo virtuoso.

Agricultura periurbana e hortas comunitárias, evidenciam-se a olhos vistos. E cestas básicas de produção orgânica comercializadas diretamente pelos agricultores disseminam-se. Just time. Entregam nos lares. A mídia social, especialmente o WhatsApp facilita a contato. Jogo do tipo ganha-ganha.

Não importa onde, nem quando, concluímos uníssonos: o celeiro do lar é a chave segurança alimentar. É o ontem e hoje dando-se as mãos.

                                                     Joinville, 22 de fevereiro de 2021


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